O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, rejeitou na semana passada o Acordo de Paris, firmado pela gestão anterior e considerado um marco histórico no combate ao aquecimento global por engajar 196 países e extrair compromissos dos maiores poluidores do mundo.

O aquecimento global é descrito como um dos principais temas de nossa era, sendo tratado pela comunidade científica como matéria que requer medidas urgentes.

Não à toa, há mais de 40 anos, desde a Conferência de Estocolmo, em 1972, ganhou destaque no campo das negociações diplomáticas internacionais, dando origem a diferentes arranjos multilaterais.

Todos sabemos que o assunto é delicado e controverso. Primeiro, porque estamos lidando com um bem público, cujas crises o mundo inteiro sofre, mas sobre o qual nem todos os países estão dispostos a assumir custos e responsabilidades.

Segundo, porque algumas nações possuem mais condições de barganha do que outras no processo de negociar. Para moldar a agenda e aderir a um regime de meio ambiente, há de se considerar a capacidade que um governo tem de resistir a pressões internas, com interesses sensíveis ao que é negociado, assim como de arcar com o ônus das mudanças e adaptações necessárias.

Trump alegou que os termos do Acordo de Paris prejudicam a competitividade dos Estados Unidos e a criação de empregos, retomando uma narrativa já empregada no passado por outros negociadores norte-americanos. Além disso, afirmou que o tratado não extraiu compromisso significativo de players importantes, sobretudo da China, o que também não é novo.

A administração norte-americana perde de vista que, para além da preservação do meio ambiente, o Acordo de Paris representa um legado importante em matéria de criação de consensos.

No plano internacional, conseguiu encontrar zonas de convergência que permitiram aproximar quase todos os países do mundo, com exceção de Síria e Nicarágua.

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No plano doméstico, convenceu a maior parte da opinião pública norte-americana de que seus termos pareciam razoáveis, o que teve repercussões significativas inclusive no setor empresarial – Apple e IBM, por exemplo, seguem apoiando o texto, e até mesmo a ExxonMobil reconhece sua importância.

Trump reforça a impressão de que seu objetivo central é negar por completo a agenda de seu antecessor, o democrata Barack Obama.

Grandes acordos tendem a ser imperfeitos pela multiplicidade de interesses que envolvem. Apesar disso, em tempos nos quais é difícil construir pactos consensuais, tanto sociais quanto internacionais, Trump desperdiçou a chance de colocar-se como líder em um dos poucos arranjos nos quais já havia vencido a capacidade conciliadora.

Poderia beneficiar-se desse status sem comprometer elevado capital político. No lugar disso, preferiu governar para a minoria, para a ala nacionalista do Partido Republicano e parte do eleitorado conservador. Outra vez, virou as costas para a ordem internacional erigida pelos próprios Estados Unidos há 70 anos.

Trata-se de uma manifestação do lado perverso da política: quando visões de mundo divergentes, acompanhadas de vaidade e senso de oportunidade, comprometem a criação de um projeto de desenvolvimento de longo prazo.

O governo norte-americano poderá propor uma renegociação futura do Acordo de Paris – e mesmo a retirada efetiva deste compromisso não é imediata, devendo levar anos. De qualquer forma, os Estados Unidos de Trump ainda carecem de um plano estratégico. Sem pensar o futuro, seguem tentando reviver o passado.


[Texto originalmente publicado na Folha de S. Paulo, em 07/06/2017.]