No último dia 8, aconteceu o que poucos esperavam: Donald Trump, do Partido Republicado, foi eleito presidente dos Estados Unidos da América. Depois de uma campanha bastante disputada com a candidata democrata Hillary Clinton, a qual era apontada pelas pesquisas de intenção de voto como à frente na corrida eleitoral, o empresário logrou a vitória ao atingir a maioria dos colégios eleitorais.

Com base no discurso adotado por Trump durante a campanha, é possível afirmar que sua trouxe grandes preocupações para o México. Propostas como a construção de um muro fronteiriço, que deveria, na opinião do candidato, ser pago pelo México, o discurso preconceituoso e intolerante com relação aos imigrantes e a proposta de renegociação do NAFTA e dos mega-acordos regionais afetam a imagem do México no mundo e também as expectativas do país quanto as relações com os EUA. Ainda é difícil falar quais serão as consequências para tal relação no curto e médio prazo, o que justamente vai depender do que de fato o candidato eleito implementar. Ainda assim, mesmo diante da incerteza associada à vitória de Donald Trump, os periódicos mexicanos já falam em efeitos negativos.

Durante a campanha eleitoral, a questão migratória ocupou posição-chave, o que afeta a dinâmica doméstica mexicana e sua relação com os EUA. De acordo com o Pew Research Centre (2015), metade dos imigrantes que vivem ilegalmente nos EUA são mexicanos, seguidos pelos provenientes dos países da América Central – El Salvador e Guatemala. Em 2015, apesar de apontar que 70% dos norte-americanos eram favoráveis a que os imigrantes permanecessem no país legalmente, o Instituto já indicava divergências partidárias – os republicanos consideravam como prioridade a segurança nacional, enquanto os democratas, apesar de também terem esta preocupação, defendiam a permanência destes grupos como cidadãos nacionais. É possível identificar, portanto, que a questão migratória veio sendo considerada de forma mais conservadora nos EUA desde janeiro de 2015, mês da pesquisa do Pew Research. Neste ano, grande parte da população norte-americana defendia a permanência dos imigrantes, e hoje vence o candidato que promete o endurecimento das leis.

Como é sabido, muitas das medidas propostas por Donald Trump durante a campanha não dependem apenas do seu voluntarismo, mas também de outras instituições, como o próprio Congresso. Assim, por mais que o muro não seja construído ou o NAFTA não seja renegociado, a eleição de Trump mostra que seu discurso agressivo possui bases em parcelas da sociedade norte-americana, o que indica o preconceito com relação aos imigrantes residentes nos EUA e também aos próprios cidadãos do México. Ademais, sua proposta de renegociar o Tratado da Parceria Transpacífico vai contra o principal feito da política comercial do presidente Barack Obama, na qual o México também é participante.

O efeito imediato do resultado das eleições dos EUA no México foi o monetário. Na madrugada da contagem de votos, o peso mexicano chegou a desvalorizar 13%. Nos últimos dias, a desvalorização atingiu 15% e a Bolsa teve a pior queda dos últimos cinco anos. O periódico mexicano El Economista chegou inclusive a classificar esta semana como sendo a pior desde a crise financeira de 2008, classificando-a como “semana de terror” pelos efeitos no peso mexicano. A moeda já vinha sofrendo instabilidade com o aquecimento da campanha eleitoral, mas passara por relativa estabilização quando Hillary Clinton vinha sendo apontada como vencedora nas pesquisas. É importante destacar que a desvalorização monetária tem efeitos financeiros e comerciais importantes, o que pode refletir diretamente no crescimento econômico do México. Diante de tamanha instabilidade econômica, que se soma à instabilidade política já enfrentada pelo presidente Peña Nieto, o recém-eleito Trump e o mandatário mexicano já combinaram um encontro antes da posse, em janeiro de 2017.

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Em declaração oficial realizada dia 9/11, Enrique Peña Nieto afirmou que começará a discutir uma nova agenda com o candidato eleito, a qual marcará o estabelecimento de um “novo capítulo” na relação bilateral. Para o mandatário mexicano, o diálogo é a base para o estabelecimento de uma relação de cooperação, segurança e prosperidade entre as nações. Ademais, destacou a importância dos mexicanos residentes nos EUA para o desenvolvimento do país e, portanto, o caráter de interdependência das relações bilaterais, principalmente no campo econômico e social. Por sua vez, a chanceler mexicana, Claudia Ruiz Massieu, reiterou que nos próximos meses serão discutidos os elementos de referência da relação bilateral com o novo presidente dos EUA. No que tange à proposta de Trump de construção de um muro fronteiriço, a Secretaria afirmou que “está fora da visão do México” pagar por ele, já que o país adota como postura a integração e a possibilidade dos dois países trabalharem juntos.

As declarações indicam a tentativa da diplomacia mexicana de buscar pontos de convergência com os Estados Unidos no novo cenário que se mostrará vigente a partir do próximo ano. Diante da dependência mexicana em relação ao vizinho, percebe-se que é necessário entender-se com Donald Trump, ainda que pareça um grande desafio. Deve ser destacado que tanto para o presidente, quanto para a chanceler, o momento exige que se discutam os marcos desta relação, já assumindo que haverá grandes possibilidades de mudanças. O tom do presidente do México e da chanceler foram “conciliadores”, minimizando o discurso de Donald Trump e procurando destacar que há espaço para pontos de concordância entre os países. Ainda assim, as análises vêm sendo bastante negativas, inclusive demandando pedidos de desculpas por parte de Trump devido ao seu discurso ofensivo em relação aos mexicanos.

Por mais que o México tenha sido citado por Donald Trump de forma bastante negativa durante a campanha, ele é um país que não pode ser ignorado pelos Estados Unidos. Não é possível afirmar que o México seja prioridade para a inserção internacional dos EUA, mas também não é, nesse sentido, um ator insignificante. Além dos fluxos comerciais, os dois países compartilham fronteiras com dimensões sociais e de implicações para a segurança nacional da grande potência. Por si só, esse é um elemento que deve garantir algum entendimento mútuo, ainda que pouco contemple os interesses estratégicos da política externa do México para com os Estados Unidos.

Como afirmam alguns analistas, é necessário que o México se prepare para o pior.